Este recém nascido milênio, adolescente século e maduro decênio vêm de deparar-se com a fadiga do Sistema Representativo. O cidadão se expressa em WhatsApp, Twitter, mergulha no Google Earth, nanotecnologia, Bitcoin, uma revolução tecnológica que transforma nossa vida, o trabalho e a forma como nos relacionamos: “4ª Revolução Industrial”?
Fechamo-nos em condomínios, centros comerciais, pequenas aldeias, entretanto, globais. A arte, sempre na vanguarda, deixara, há muito, o cavalete para expressar seu “estranhamento” no cotidiano e convocou o expectador para protagonista. A perspectiva, assim, cedera lugar ao Dada; a Duchamps; ao “Pop Art” com Latas Campbell, de Warhol; ao samba/neoconcreto do “Parangolé” de Oiticica, pulsante criação interativa.
Tais metáforas – no século 21 – prenunciam, no ambiente do Direito, da democracia, da teoria geral do Estado, o abandono do discurso para, igualmente, atirar o governante à vida real, aos múltiplos e aleatórios fragmentos do humano, cuja colagem em retalhos conforma uma sociedade plural e caleidoscópica.
Não falta tecnologia a permitir ao cidadão aprovar diretamente novas leis, via identidade digital, como nas contas bancárias; ou a facial, do IPhone X, reservando-se ao “Parlamento” o papel de sistematizar e redigir propostas legislativas.
Ademais de ampliar o protagonismo no Executivo como “concessionário” de quase todos serviços públicos, fica reservado ao governo regular, fiscalizar, a segurança e a Justiça. A arbitragem e a mediação consubstanciam, crescentemente, o espaço do juízo privado.
Outro dia conhecemos o “OM.art”, espaço livre, urbano, carioca, ecológico, destinado à criação, à transcendência, à alegoria da vida transmutada em arte, inaugurado com a “Rhodislandia” de Oiticica, integrado à intervenção de Berna Reale, 40 anos depois.
O Brasileiro carece dessa transcendência, da lírica, da poética, para poder lidar com a cotidiana e absurda violência, como sugerira Samuel Wainer a Nelson Rodrigues, para uma nova coluna com a dimensão trágica do noticiário policial da “Última Hora”, dando à luz “A vida como ela é”.
A violência urbana e política deixa perplexo o cidadão com tiroteios e assaltos à luz do dia, a putrefação do sistema político e a septicemia fétida do aparelho estatal.
Considerações morais e personalizadas serviriam apenas para blindar o “Ovo da Serpente”, ou seja: o “Estado Paternalista”, que 88 fez substituir ao “Estado Policial Militar”, mas perfilhou seu filho bastardo, o “Capitalismo de Estado, Corporativista”, esdrúxula combinação do loteamento e da cooptação, herdeiro do “Estado Novo”, versão Macunaíma do neofascismo.
Da “Nova República” resta-nos a falência financeira e ética do presidencialismo de cooptação. A transcendência só nascerá de uma “Constituinte Exclusiva”, com homologação popular, que redesenhe o Brasil.
Assim, talvez possamos inaugurar nova democracia menos representativa, mais direta, menos coronelista, mais meritocrática, estruturada em voto distrital e campanha de TV, expositiva.
Os Estados formam-se, basicamente, para promover a segurança pessoal, coletiva e jurídica; é preciso assegurá-las. Devemos, de agora em diante, igualar direitos trabalhistas e previdenciários do servidor público ao privado. Estabilidade, só para militares, Judiciário e MP, cinco anos de efetivo e folha constantes.
Simplificar a tributação, cujo peso percentual pode decrescer, com aumento da arrecadação, se menor que o incremento do produto (base de volume). Serviço público eficiente e transparente, com negócios abertos na TV e Internet, ao vivo.
Adeus, Macunaíma, herói sem caráter! Seja bem-vinda, Constituição da “4a Revolução Industrial”. Oiticica poderia até chamar você de “Constituição Parangolé”!
Hélio Paulo Ferraz
* Vice-presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro; advogado colaborativo e mediador
Fonte: Jornal do Brasil