A maioria política no Brasil, formada por conservadores, liberais e social-democratas, pavimenta uma trajetória econômica de vezo liberal desde a aliança PFL/PRN, em 1990, e a retomada com o PSDB/DEM ressurge ampla, no pós-impeachment.
Divergências entre conservadorismo e liberalismo de costumes, não impedem, entretanto, a convergência quanto à liberdade econômica, em seu sentido amplo, à desburocratização, à limitação investidora do Estado, à rejeição ao corporativismo e ao equilíbrio fiscal, ora constrangido pela urgência e a escala das medidas mitigadoras dos efeitos da pandemia.
Converge-se, ainda assim, substancialmente, na desoneração da folha, imposição da concorrência global, vide Uber, Zoom, Teams, ou seja, a “economia colaborativa e digital”.
Ora, a reforma tributária precisa se adequar à nova ordem, ao largo de querelas políticas, entre grupamentos eleitorais — mesmo à véspera das eleições municipais. Pois, a sociedade reclama das diferentes correntes respostas urgentes à crise e à Revolução econômica que protagonizamos.
Inteligência artificial, Big Data, criptomoedas, robótica, impressoras 3D, Internet das Coisas e nanotecnologia, a comunicação digital e o home office transformam a economia e a sociedade, tornando obsoletas as instituições e premissas jurídicas vigentes.
O comércio eletrônico, discos e CDs (agora streaming) e os softwares, na nuvem, em lojas virtuais e baixados, são emblemáticos. Os enormes desafios de uma economia disruptiva, crescente no planeta, levam o princípio tributário da territorialidade a uma acelerada mitigação.
A reforma reclama princípios convergentes e a adequação à emergente “economia do conhecimento”, tendo como elemento catalítico entidades empresariais, como a nossa Associação Comercial do Rio de Janeiro, a Casa do Empresário.
Neste contexto, de princípios, em nosso ver, devem nortear a reforma tributária:
1) A simplificação do sistema: reduzirá o gasto — hoje o dobro da média mundial em horas trabalhadas, segundo o Banco Mundial — necessário ao recolhimento de impostos. Uma concreta redução da carga tributária, que não reduz a arrecadação.
2) Descentralização da cobrança: a fixação de alíquota uniforme, mas a coleta de tributos, autônoma, por cada unidade federada.
3) Um único fato gerador: faz nascer a obrigação tributária, em favor de cada um dos três entes federados, simultaneamente, preservada a exclusiva competência arrecadatória de cada um, definida pelo domicílio da “transação”. Assim, a venda de uma geladeira, numa loja, em Copacabana, no Rio de Janeiro, seria fato gerador do “Imposto sobre Transações” alocado em percentuais diferenciados à União, Estado e Município.
4) Integração à economia digital: unificação do fato gerador, do momento e do local de incidência, ao lado da autonomia exatora de cada ente federado.
Assim, a distinção entre licenciamento e venda de cópias de programas, bens tangíveis e intangíveis, mercadoria e serviço torna-se irrelevante, em vista da adoção da “transação”, como fato gerador único.
5) Transação em “nuvem”: não está delimitada a um espaço municipal, estadual ou nacional. Portanto, a base territorial de tributação pode se calcar no domicílio societário, fiscal ou bancário, do comprador, ou do vendedor. Reiteramos: o mesmo fato econômico, o mesmo momento, o mesmo local, autonomia e independência exatora à cada unidade da federação.
6) Imposto de Renda Negativo: desafio de construir um desenho fiscal e técnico que funcione para a ideia de Imposto de Renda Negativo, em formato a ser definido em amplo e democrático debate.
O estabelecimento das alíquotas com vistas ao equilíbrio fiscal e sem encargos adicionais ao cidadão e empresário, precisa, suceder estimativas dos impactos pelo Poder Executivo, avaliação do Congresso, Estados e Municípios, tudo amparado no debate aberto com a sociedade organizada.
*Hélio Paulo Ferraz é empresário e vice-presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro.
Fonte: Estadão